Liberta meu povo: o chamado da igreja contra o tráfico humano
Disse o Senhor: "De fato tenho visto a opressão sobre o meu povo"...Assim diz o Senhor, o Deus de Israel: "Deixe o meu povo ir". Êxodo 3:7a, 5:1b
Preâmbulo
Nós, um grupo de 52 lideranças de 29 igrejas-membros da Comunhão Anglicana, incluindo Primazes, bispas/os, clero e leigas/os, nos reunimos de 30 janeiro a 2 fevereiro 2023 em Dar es Salaam, República Unida da Tanzânia para a IV Consulta Internacional Trienal da Sociedade Unida Parceiras no Evangelho (USPG). Sediada pela Igreja Anglicana de Tanzânia, o tema da nossa consulta foi: 'Liberta meu povo: o chamado da igreja contra o tráfico humano'.
A escolha da Tanzânia como local da nossa reunião foi significativa devido aos importantes avanços no enfrentamento ao tráfico de pessoas que a Tanzânia (país de origem, trânsito e destino do tráfico humano) tem alcançado nos últimos anos. Nossa ompreensão do tráfico humano como uma forma de escravidão moderna aprofundou-se ainda mais durante a nossa visita a Zanzibar, um antigo centro do comércio de escravos na África Oriental.
A visita ofereceu aos participantes a oportunidade de se debater com as complexidades duradouras da história missionária das igrejas-membros da Comunhão Anglicana. Reconhecemos que em todo o mundo, essa história está entrelaçada com as complexas heranças da escravidão que afetam diversos grupos de pessoas. Elas incluem os descendentes de escravos e aqueles que negociavam e se beneficiavam diretamente do trabalho escravo, assim como aqueles cujas terras foram colonizadas e aqueles que, através da violência e genocídio, se apoderaram da terra de outros, deslocando populações e culturas locais.
Em um contexto de adoração, comunhão, estudos bíblicos e visitas guiadas, tivemos a oportunidade de escutar e de aprender com experiências e informações extensas e abrangentes de exemplos históricos e contemporâneos da desumanidade da humanidade contra si mesma.
Oferecemos esse comunicado em um espírito de oração, louvor, penitência e uma crescente consciência da necessidade de trabalhar colaborativamente. Oferecemos ele como uma afirmação da nossa fé, um reconhecimento da complexidade da questão e, em um contexto global de tráfico de pessoas e escravidão moderna, da nossa vontade de agir em resposta à proclamação de Deus: 'Liberta meu povo'.
Afirmação:
Afirmamos
a dignidade inerente e a liberdade de todos os seres humanos em virtude de serem criados à imagem de Deus sem exceção. Essa identidade comum como portadores da imagem divina nos obriga a não distorcer a imagem de Deus através da objetificação dos outros e da desumanização de nós próprios.
nossa fé trinitária no Deus que acompanhou Agar, que ouviu o clamor dos escravos hebreus e cujo Espírito fortaleceu Jesus a proclamar a libertação dos cativos, nos chama como Igreja para responder ao pecado e ao escândalo do tráfico humano a partir do princípio de solidariedade.
ser preciso escutar e aprender com as/os sobreviventes de tráfico humano e de escravidão moderna que vivem nas nossas comunidades, e trabalhar em parceria com elas/es, guiadas/os por suas vozes enraizadas na experiência vivida.
que o contexto adequado do bem-estar humano é a justiça em nível individual e institucional. Isso exige o desenvolvimento e o reforço de instituições justas que permitirão a todas as pessoas de se empenhar pela boa vida com e para os outros, e que nos incentivarão a ministérios que são, por definição, pastorais, proféticos e públicos.
Reconhecimento:
Reconhecemos:
a urgência para que a Igreja examine o seu passado e se arrependa de sua cumplicidade histórica e contínua na escravidão de pessoas. Também que ao tratar das questões de cumplicidade, requer que as igrejas e comunidades entendam que ser discípulas de Cristo necessita um compromisso ativo na procura de transformação institucional assim como pessoal.
que nosso atual sistema global reflete o imperialismo do passado que foi fundado sobre a exploração dos povos e do planeta. Esses sistemas globais agravam as causas principais do tráfico humano como, por exemplo, a desigualdade econômica e social, instabilidade política, conflitos étnicos, e mudanças climáticas - todos os quais estão ligados às questões persistentes de racismo, preconceito social e exploração dos povos indígenas.
que séculos de exploração e pilhagem têm contribuído ao deslocamento global de pessoas, muitas das quais, em sua busca por uma vida melhor, acabam sendo vítimas de tráfico e escravidão.
que apesar do envolvimento de muitas igrejas locais e da comunidade em geral, é necessário consolidar os esforços no enfrentamento dos desafios do tráfico humano e escravidão moderna.
que os legados nefastos e persistentes da escravidão, assim como o seu enredamento com formas modernas, são identidades perdidas, vidas perdidas, famílias destruídas, infância destruída, corpos explorados e traumas duradouros. E que tudo isso exige soluções que abrangem a reparação, responsabilização, reconciliação e restauração.
que qualquer resposta ao tráfico de pessoas e à escravidão moderna precisa estar profundamente consciente da dimensão de gênero. No tráfico de pessoas e na escravidão moderna, as mulheres e crianças são frequentemente afetadas de forma desproporcional. A questão de gênero no contexto do tráfico humano reflete e replica modos de pensar que reduzem mulheres e crianças e as privam de autonomia e agência.
que os contextos globais de tráfico de pessoas e escravidão moderna são extremamente complexos e diversos. Isso exige, portanto, uma forte atenção às realidades locais, às legislações e aos mecanismos de reparação, a fim de responder à questão de complexidade de forma tendente à valorização da vida e à proteção, preservação e promoção da segurança e dignidade dos sobreviventes.
Ação: Nosso compromisso
Acreditamos juntas e juntos que agora é a hora de as igrejas agirem de forma colaborativa, corajosa e solidária para enfrentar a injustiça do tráfico de pessoas e da escravidão moderna. Portanto, nós nos comprometemos às seguintes ações:
Como indivíduos nos comprometemos a:
aprender mais sobre o tráfico de pessoas e a escravidão moderna e as questões complexas associadas.
assumir a responsabilidade de sensibilizar as famílias, as igrejas e as comunidades sobre o tema.
Exortamos nossas igrejas a:
reconhecer publicamente e trabalhar para compreender melhor nossa cumplicidade no tráfico de pessoas e na escravidão moderna, no passado e no presente.
trabalhar intencionalmente em conjunto com as igrejas-membros em toda a Comunhão Anglicana para enfrentar o tráfico de pessoas e a escravidão moderna.
promover e desenvolver melhores práticas para atingir a eliminação do tráfico de pessoas e fortalecer a conscientização nas igrejas sobre políticas efetivas.
ensinar e capacitar congregações a estarem atentas a seus contextos e equipá-las para ler os sinais do tráfico de pessoas e da escravidão moderna. Estar consciente das práticas que podem estar ocorrendo nas suas próprias comunidades e garantir que as congregações sabem os métodos seguros para relatar as preocupações às autoridades interessadas.
comprometer-se a ser lugares de refúgio e segurança para todas as pessoas e fornecer apoio espiritual, emocional e prático adequado aos sobreviventes.
comprometer-se as 'Diretrizes para aumentar a segurança de todas as pessoas nas províncias da Comunhão Anglicana' (Comissão Igreja Segura da Comunhão Anglicana).
envolver-se com os governos na legislação e políticas para resolver os fatores econômicos e ambientais que vulnerabilizam comunidades ao tráfico de pessoas.
trabalhar junto às forças da ordem para responsabilizar os criminosos.
apoiar os sobreviventes através de colaboração com vários parceiros, incluindo aqueles com experiência vivida, organizações da sociedade civil, parceiros ecumênicos e interreligiosos para abordar o tráfico humano com foco nas medidas preventivas e restaurativas.
Como USPG nos comprometemos a:
produzir recursos teológicos relevantes e facilitar a promoção e criação de redes e recursos para apoiar o trabalho da Comunhão Anglicana.
Agradecimento...
Desejamos expressar nossa profunda gratidão à Igreja Anglicana da Tanzânia e à Diocese de Dar es Salaam por nos receberem graciosamente e por seu considerável apoio logístico com os arranjos de transporte, pelas oportunidades de participar nos cultos de adoração nas igrejas locais e aprofundar nossa compreensão do contexto e cultura locais, especialmente através da visita às Catedrais de Dar es Salaam e Zanzibar. Gostaríamos de agradecer a todas/os que contribuíram para a Consulta na qualidade de oradores, apresentadores, líderes de estudo bíblico, intérpretes e líderes de louvor; e a todos os membros do Grupo Consultivo da USPG vindo de toda a Comunhão Anglicana, a equipe da USPG e junta diretiva, por seu apoio.
Agradecemos a Deus pela oportunidade de congregar para orar e aprofundar nossa compreensão daquilo a que Deus nos chama como líderes e representantes das igrejas e igrejas-membros da Comunhão Anglicana. Com base nessa comunhão, nos comprometemos a assegurar que as aspirações dessa Consulta sejam realizadas dentro de nossas igrejas-membros à medida que cumprimos, como indivíduos e um conjunto, o chamado de Deus para 'Libertar meu povo'.
Durante o dia o Senhor ia adiante deles, numa coluna de nuvem, para guiá-los no caminho, e de noite, numa coluna de fogo, para iluminá-los, e assim podiam caminhar de dia e de noite. Êxodo 13:21
Assinado por Primazes e representantes das seguintes igrejas-membros e USPG.
Arcebispo Juan David Alvarado | Iglesia Anglicana de la Region Central de America |
Arcebispa Marinez Santos Bassotto | Igreja Episcopal Anglicana do Brasil |
Arcebispo Albert Chama | Igreja da Província da África Central |
Arcebispo Leonard Dawea | Igreja Anglicana da Melanésia |
Arcebispo Dr Howard Gregory | Igreja da Província das Índias Ocidentais |
Arcebispo Michael Lewis | Província da Igreja em Jerusalém e Oriente Médio |
Arcebispo Samuel Sunil Mankhin | Igreja de Bangladesh. |
Arcebispo Carlos Simão Matsinhe | Igreja Anglicana de Moçambique e Angola |
Arcebispo Dr Maimbo Mndolwa Igreja Anglicana de Tanzânia
Arcebispa Linda Nicholls Igreja Anglicana do Canadá
Arcebispo Stephen Than Myint Oo Igreja da Província de Myanmar
Arcebispo Dharmaraj Rasalam Igreja do Sul da ÍndiaThe Church of South Índia
Arcebispo James R. Wong Yin Song Igreja da Província das Índias Oceânicas
Primus Mark Strange Igreja Episcopal Escocesa
Bispo Maximo Rhee Timbang Iglesia Filipina Indipendiente
Bispo Alexander Kobina Asmah Igreja da Província da África Ocidental
Bispo Sameer Khimla Igreja do Norte da Índia
Bispo Eddie Moral Igreja Episcopal das Filipinas
Bispo Danald Jute Igreja da Província do Sudeste da Ásia
Bispo Dr John Perumbalath Igreja da Inglaterra
Revma. Deã Dr Sarah Rowland Jones Igreja em Gales
Venerável Emad Basilios Província Episcopal/Anglicana de Alexandria
Revdo Cônego Titus Ho-Wook Kim Igreja Anglicana da Coréia
Revdo Joseph Chow Hong Kong Sheng Kung Hui
Revdo Chris Frazer Igreja Anglicana de Aotearoa, Nova Zelândia e
Polinésia
Sra. Tomie Kaneko The Nippon Sei Ko Kai (Comunhão Anglicana no
Japão)
Sra. Pachi Zabala Igreja Anglicana da América do Sul
Sr Nagulan Nesiah Igreja de Ceilão
Revdo Dr Duncan Dormor USPG
Bispo Derek Kamukwamba Igreja da Província da África Central
Revmo. Deão Orisi Vuki Igreja Anglicana de Aotearoa, Nova Zelândia e
Polinésia
Ven Dr Rienze Perera Igreja de Ceilão
Revdo Canon Wadie Far Província da Igreja em Jerusalém e Oriente Médio
Revdo Dr Michael Clarke Igreja da Província das Índias Oceânicas
Sra Esther Kazimani-Pale Igreja Anglicana de Moçambique e Angola
Ven Kofi deGraft-Johnson Secretário Geral, CAPA (Conselho Anglicano das
Províncias na África)
Dra Agnes Aboum Igreja Anglicana Quênia / Ex-Moderadora do
Conselho Mundial de Igrejas
Sr Joel Kelling Aliança Anglicana, Diocese Jerusalém e Oriente
Médio
Revdo Moses Matonya Secretário Geral, Conselho de Igrejas Cristãs de
Tanzânia
Bispo Jackson Sosthenes Diocese de Dar es Salaam, Igreja Anglicana de
Tanzânia
Bispo Dickson Chilongani Diocese de Dodoma, Igreja Anglicana de Tanzânia
Bispo Elias Chakupewa Diocese de Tabora, Igreja Anglicana de Tanzânia
Cônego Bethuel Mlula Secretário Provincial Igreja Anglicana de Tanzânia
Revdo Jacob Kahemele Deão da Catedral São Alban, Diocese de Dar es Salaam
Junta Diretiva da USPG: Sr John Neilson, Sr Martin Uden e Sra Catherine Wickens
USPG: Sra Fran Mate, Sra Rebecca Boardman, Revdo Davidson Solanki, Dr Paulo Ueti, Cônego Dr Peniel Rajkumar, Dr Jo Sadgrove, Sra Ife Olowoniyi, Sr Vijay Christian e Sra Rachael Anderson.
Intérpretes: Revdo Warren Wilson, Dr Paulo Ueti, Sra Rachel Weller.
Assessoras/es convidados:
Dr. Philip Isdor Mpango, Vice Presidente da República Unida da Tanzânia.
Dr James Kofi Annan, Fundador e Presidente de Challenging Heights, Accra Ghana.
Dra. Anna Peter Makakala, Comissária Geral de Imigração da República Unida da Tanzânia. Prof. Palamagamba John Aidan Mwaluko Kabudi, advogado tanzaniano e ex-ministro das Relações Exteriores e da Cooperação da África Oriental da República Unida da Tanzânia. Godfrey Mpandikizi, Diretor Executivo da Iniciativa Legal e Anti-Tráfico de Pessoas na Tanzânia (TATLI).
Ken Heriel, Assistente de Projeto da Organização Internacional para as Migrações (OIM) da Tanzânia.