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Homilia
Celebração de 4ª feira de Cinzas 2021
17 de fevereiro

«Que as palavras da minha boca e a meditação dos nossos corações, sejam agradáveis, perante Ti ,Senhor, nossa rocha e nosso libertador».
Amén.

 
Jesus disse aos seus discípulos: «Permaneçam unidos a mim, que eu também permaneço unido a vocês». (João 15,4).
 
Permanecerem Cristo é uma atitude interior que gera raízes em nós com o correr do tempo. Tal é o propósito da Quaresma e de cada Quaresma da nossa vida; ajudar-nos a permanecer cada vez mais em Cristo e no seu amor. Permanecer em Cristo requer a nossa disponibilidade e intenção. Para podermos permanecer n’Ele, temos que caminhar ao seu encontro ou na linguagem da fé, abrir o coração (o mais íntimo de nós próprios) à sua presença. Com efeito, o que a Quaresma nos ajuda a perceber e a viver é que Cristo já permanece e está em nós, muitas vezes, sem que de tal tenhamos consciência. Santo Agostinho exprime esta realidade, quando numa bonita confissão e pensamento nos refere «Tarde te amei ó beleza tão antiga e tão nova ! Tarde demais eu te amei ! Eis que habitavas dentro de mim e eu te procurava fora ! Eu, disforme, lançava-me sobre as belas formas das tuas criaturas. Estavas comigo, mas eu não estava contigo.»
 
Podemo-nos perguntar de onde advém a dificuldade em reconhecer a presença de Cristo em nós. O que nos impede de acolher e aceitar uma presença amorosa que já está em nós na ação do Espírito Santo? O Salmo 32, que recitamos juntos no passado domingo, e que hoje tornamos a colocar perante Deus, ajuda-nos a compreender o motivo dessa dificuldade. Este Salmo é o testemunho de um convertido que na sua confissão e arrependimento soube expor as suas faltas a Deus; «Confessei-te então os meus pecados e não escondi as minhas culpas. Eu disse: «Confessarei ao Senhor os meus erros».  O alívio e a harmonia interior que o Amor redentor de Deus lhe provoca, leva-o a exclamar: «Feliz o homem a quem foram perdoadas as culpas, a quem foram absolvidos os pecados. Feliz o homem em quem o Senhor não encontra iniquidade, em cuja consciência não há maldade.» 
 
Santo Agostinho tinha um grande apreço por este Salmo e afixou uma cópia na parede do seu quarto, diante do seu leito. A abertura do nosso coração a Deus, permite não só, que o Amor de Deus assuma o nosso pecado como, também nós, possamos ver e perceber no nosso interior, uma presença até então, não ausente, mas escondida pelas trevas do nosso próprio pecado. Desejos desordenados, pensamentos irrefletidos, emoções descontroladas, geram em nós muito barulho, muita agitação, muita perturbação que nos impedem de realizar a viagem mais exigente que se nos coloca e que consiste precisamente na viagem ao nosso ser mais profundo, ao interior da nossa pessoa e nele reencontrarmos Jesus Cristo. O arrependimento é sempre o momento marcante e que despoleta este caminhar interior.
 
A Quaresma é um caminhar simbólico de 40 dias às profundezas do nosso ser. É um caminhar que apura a nossa vocação e desejo para a santidade e não para o pecado. A Quaresma através das suas diferentes observâncias alimenta esse desejo que como alguém já referiu «é o vento que enfuna as velas e faz andar o barco; o desejo de santidade é o motor da vida espiritual».  
 
A Quaresma é, pois, o tempo propicio para o reconhecimento das muitas presenças interiores que ainda nos impedem, de sentir aquele, que permanece em nós desde o nosso batismo; Cristo Jesus. O arrependimento e a confissão dos nossos pecados são condição necessária para que o perdão de Deus se faça presente e ilumine o nosso interior e caminhar de vida. Quando tal acontece, sentimo-nos, tal como o salmista e Santo Agostinho, reconciliados, felizes e unidos interiormente. E a paz que vivemos interiormente e em comunhão com Cristo, no qual permanecemos, leva-nos a produzir fruto, o fruto do Seu amor em nós. 
 
Assim, o fruto da Quaresma não é apenas interior, mas revela-se também na dádiva e na renúncia em favor dos outros e em favor da Criação de Deus. A proposta «Reconstruir Melhor – um Jejum pela Terra – Quaresma 2021» chama-nos a um caminhar quaresmal capaz de «cuidar do corpo, da mente, do espírito, da comunidade e do planeta». A Quaresma comporta, pois, um caminhar individual que só se compreende também no caminhar da humanidade que somos no contexto da casa comum («Oikos») na qual nos inserimos. E o reconhecimento do nosso pecado individual ajuda-nos também a perceber a dimensão do pecado coletivo que juntos fomos (infelizmente) construindo e que hoje assume diversas e gravosas expressões.  
 
O contexto de pandemia desta Quaresma é naturalmente diferente do contexto de Quaresma anteriores. Mas a essência espiritual da Quaresma é a mesma e talvez hoje e nas atuais circunstâncias ainda mais necessária para a nossa vida. Por isso, gostaria desde já, de vos convidar a integrarem um dos diversos grupos de reflexão e de partilha bíblica, que se irão criar nesta Quaresma 2021. Será uma vivência via plataforma Zoom intitulada « Fé em tempos de Corona Vírus» cuja riqueza dependerá da adesão e da abertura de cada um de vós. Todos são naturalmente convidados e bem-vindos. 
 
Saibamos caminhar juntos até à Páscoa de Jesus Cristo! 
 
Santa Quaresma! Amén.

+ Jorge

 

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